quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Bebendo e.

Era dia de aula e Catrina resolveu faltar afim de entregar os objetos prometidos. Vai até a casa dele que sempre a divertiu contando aquelas piadas malditas de humor ácido.
Chega até o prédio onde são as baratas que seguram suas estruturas de tão velho e aperta a campainha levando um choque. O porteiro vem arrastando seus chinelos e resmungando pelo horário que não é mais seu dever.
Ela entra e espera o elevador. Desce no quinto andar e ao abrir a porta sente o cheiro de mofo das paredes e dos apartamentos daquele andar.
Bate a porta. Uma, duas, três vezes e ele abre.
- oi Beatrice
- iai Cat
Os dois se cumprimentam com um beijo e um forte abraço, depois ela senta na cama e começa a falar das novidades.
Eles conversam sobre tudo. Garotos, bebidas e falta de dinheiro
Dão risadas.
- vem cá, vamos fazer a contemplação do nada (diz Beatrice)
Decidem ir para a sala, onde o caos já predomina com roupas, acessórios e sapatos de brechó espalhados por todos os lados.
Afasta para os cantos o que não serve e estende uma toalha estilo boliviana no centro. Nas frestas do chão de taco coloca cds que hoje estão riscados, e ao som de Pink Floyd deixa a luz vermelha do abajur iluminar a sala escura.
Respira fundo, segura o ar e fecha os olhos.
Voltam a falar sobre o nada, sobre água, sobre cervejas
Catrina propõe bebidas até o amanhecer,
mas antes Beatrice pergunta se ela quer brincar.
- de que?
- de boneca, de maquiagem, de teatro
- você brincava disso quando pequena?
- sim (Catrina responde)
Catrina e o amigo travesti vão até o banheiro minúsculo da kit e começam o espetáculo. Primeiro o panqueke, depois o batom, riscos no rosto, risadas e baforadas para o alto.
Após horas dizem-se prontas.
Na sala avermelhada cheia de tecidos e inutilidades aumentam o som do computador e começam a dançar. Daquelas músicas bregas que qualquer um hoje em dia morre de vergonha só de lembrar que já fez aquela dancinha ridícula
bebem e dançam
bebem e dançam
bebem e dançam
Catrina sente um frio nas mãos e senta-se
- mais um gole por favor
Fica sentada ali no chão, observando a Beatrice dançando... lembrando da sua infãncia, quando fazia a mesma dancinha com as amiguinhas de escola, maquiadas com as coisas das mães, dando risadas de tudo
Lembrou-se com uma saudade boa, e começa a rir sozinha por saber que esta ali, fazendo questão de pagar mico para os vizinhos dos prédios da frente que olham pela janela e não entendem nada.
Para de pensar. Fecha o olho e sente estar voando.
Leve como um pássaro.
Ele agora mostra seu papel, imita reis e plebeus, grita, pula e faz caras, seu teatro preferido.
Os dois ali, brincando de ser criança aos vinte e poucos...
bebendo, fumando e falando da vida
dançando e enrolando a música
bebendo e dançando
bebendo e dançando
bebendo e.

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